24 de novembro de 2009

a vida presa no tempo presente

como é que se conheceram?
da maneira que toda a gente se conhece: a falar. Existe outra maneira de conhecer alguém?
existe… olhas, cheiras, sentes, tocas… saboreias…
falámos durante três dias seguidos. Se-gui-dos. Sem dormir. Sem tomar banho. Mal comemos. Tínhamos tanto, mas tanto para falar, que o tempo não dava para mais nada. Pareceram-me apenas três horas. Nunca apenas três dias. Se-gui-dos. Cada minuto que passava era como mel para os meus lábios. Cada palavra dita uma ode ao momento. Cada suspiro, vida.
foi por isso que partiram?
sim, partimos. Sem parar de falar. Para poder falar. Fomos. Se-gui-dos. Seguimos sem rumo. Sem direcção. Sem objectivos. E continuámos a falar e a andar. E seguimos.
seguidos?
se-gui-dos… perseguido pelo mundo que deixámos para trás. Pela realidade persistente. Insistente que não nos deixava sonhar e voar como queríamos. Pela actualidade acutilante que gritava a cada canto que a pausa se estava a esgotar e que a vida, a nossa, se seguia, não ali, mas lá atrás, onde a tínhamos deixado. No tempo presente.
não era o presente que viviam?
nunca foi. O presente sempre foi o que os outros esperavam que vivêssemos. O aqui foi a outra dimensão que criámos, o botão da pausa que encontrámos e usámos. O aqui foi onde nos foi permitido sonhar sem amarras. Divagámos. Navegámos. Bailámos… Sonhámos. E saboreámos tanto!
durante quanto tempo?
pouco. Demasiado pouco. Menos do que queríamos. Mais do que alguma vez sonhámos. Mas sabes… as coisas boas, são seguidas, se-gui-das por nós enquanto delas nos lembrarmos. Enquanto por elas suspirarmos. Até que um dia, se acomodam confortavelmente num qualquer canto redondo da nossa memória e dão lugar a outras histórias.

3 comentários:

Anónimo disse...

Muito Bonito, Muito SENTIDO*

* Maçã e Canela

IsaCruz disse...

Parabéns. Este texto leva-me ao passado, ao presente e ao futuro. A minha pobre e triste "cabeça" só permite sair um suspiro. Mesmo tendo uma memória de elefante, pode ser que acomode num cantinho especial do meu cérebro as velhas e actuais "não histórias" de vida e saiba aproveitar o resto para dar "lugar a outras histórias".

Lina disse...

E quando todos os cantos e recantos já estão ocupados?
O que fazemos com os dias se-gui-dos que temos em mão?
E as histórias e as suas personagens para cá e para lá na nossa memória? Cumprimentam-se, partilham as suas vidas, as suas próprias histórias (ou biografias?), mudam de morada e acomodam-se junto a outra história mais interessante?