... subiu os dois últimos degraus praticamente sem fôlego e meteu a mão no bolso.
Agaixou-se com o suor a pingar da testa, com o sal a misturar-se com a saliva, com o
rimel com a água e encontrou. No exacto sítio onde as tinha deixado. Afinal, de todas as vezes que lá tinha regressado, em nenhuma delas precisou de lhes mexer. As chaves continuavam lá. Exactamente. E muitas vezes havia regressado. À sua procura. Não de outros. De si.
Fechou a porta segura. Segura de vontade. Segura que quando voltasse, tudo estaria na mesma: de cabeça para o ar. "
Até já".
Abriu a porta. Entre o medo, a certeza e o meio. A chave escorregou-lhe da mão e desapareceu. Entre o suor, os tremores e a
relutância, ao centro, entrou. O cheiro era o mesmo. Sempre o cheiro a marca territorial que
hierarquiza a cronologia das histórias. Um misto de cheiro de hotel, asséptico, com perfume de homem, forte. Podia ter entrado de olhos fechados que não haveria dúvidas... novas... Sentia a distância das paredes equidistantes e imutáveis. Betume transparente com janelas sem vidros. Vitreo para fora. Opaco por dentro. Deu dois passos. Resolveu não abrir os olhos. Entre o jogo, o prazer e a certeza, à direita, desviou-se do candeeiro de tecto que ainda estava apagado. Eram dois. Esquerda e direita. Num
equilíbrio siamês de
art nouveau. Entre o habitual, o estranho e o picante, à esquerda, o sofá. O mesmo. Vermelho fogo e moldado. Não tão
acessível, permanecia com as almofadas de urtiga no canto da sala, em cima, por cima, da cabeça. Ao lado da mesa, onde por baixo, em cima, estavam escritos os pensamentos. Os que tinham ido. No chão, ao canto, do tecto, um aranhuço trabalhava na teia intrincada que era a sua vida. A chave estava lá, lá dentro. Bastaria uma
vassoura para lá chegar. Para varrer todo um mundo que tinha ficado de pernas para o ar à saída, mas cujo tempo e distância conservaram até... à entrada.
"
Voltei!".