24 de março de 2010

Porque as estrelas também riem

«- As pessoas têm estrelas que não são as mesmas. Para os viajantes, as estrelas são guias. Para outros, não passam de luzinhas. Para outros, os cientistas, são problemas. (...) Mas todas essas estrelas estão caladas. Tu, tu vais ter estrelas como mais ninguém...
(...)
- À noite, pões-te a olhar para o céu e, como eu moro numa delas, como eu me estou a rir numa delas, para ti, é como se todas as estrelas se rissem! Vais ser a única pessoa do mundo que estrelas capazes de rir!
(...)
- E quando te tiveres consolado (porque acabamos sempre por nos consolar), hás-de sentir-te muito contente por me teres conhecido. Hás-de ser sempre meu amigo. Vai-te apetecer rir comigo. E, às vezes, sem mais nem menos, vai-te dar para abrir a janela, só porque é bom... E os teus amigos hão-de ficar de boca aberta quando te ouvirem rir a olhar para o céu. Mas tu dizes-lhes: "Pois é! As estrelas sempre me deram vontade de rir!" E eles ficam a pensar que tu estás maluco.»

Antoine de Saint-Exupéry
in
O Principezinho, pg.88

23 de março de 2010

22 de março de 2010

Do lado de cá

Do lado de cá olho. Olho e recordo. Recordo e penso. Penso e sorrio que tudo o que olho está lá. Aqueço com o olhar e com o Sol. Com a memória e o rol de pensamentos que enrolo. Sorrio ao enrolar cada um deles. Sorrio ao recordar que, com o olhar, pensei em momentos, desenrolei pensamentos, e esses, ninguém os pode tirar.

Do lado de cá olho. Olho e sorrio. Sorrio sempre. A imagem em fotogramas que corre e escorre. Que decorre a trinta e três rotações, pelo meu olhar. Ao pensar. Ebulições de areias remexidas. Emoções a peugadas, lá, inscritas. Palavras não ditas. Emoções sentidas. Que correm com o tempo. Mas marcadas, como que tatuadas. Cá.

Do lado de cá olho. Olho e sei. Sei que o Sol aquece. Sei que o corpo estremece. Sei que a memória não desaparece. Porque o Sol vem aí…

21 de março de 2010

Do lado de cá


16 de março de 2010

Equilíbrio

s. m. estado de um corpo que se mantém, ainda quando solicitado ou impelido por forças opostas; fig. igualdade; harmonia; - estável: o de um corpo que, desviado ligeiramente da sua posição, a retoma quando cessar a causa do desvio; - indiferente: o de um corpo que fica em equilíbrio, qualquer que seja a posição em que o coloquem; - instável: a de um corpo que passa logo a tomar outra posição desde que o desviem da posição primitiva; estado de -: estado em que as propriedades observáveis de um sistema não variam com o tempo. (Lat. aequilibriu).

Anda. Hoje, escolhi-te a ti para dançar.

Anda. Senta-te aí. Levanta-te dessa cadeira imaginária onde permaneces inerte e senta-te ao meu lado. De novo. Como dantes. Hoje, apetece-me falar e escolhi-te a ti. Assumo-me perante mim mesma que te escolho a ti para me ouvires. Assumo-me a ti que é contigo que me apetece falar. Assumo-me ao Mundo que me quiseste ouvir.

Anda. Tem que ser ao meu lado. Nunca atrás. À frente também não. Deixa-me olhar para ti enquanto falo, mas dá-me a desculpa para não o fazer quando me convém, porque não posso. Porque não quero. Talvez porque não consiga. Porque tenho que olhar de frente. Para o Mundo. Que é meu, todo meu, sempre que o quero assim. Para mim. Mas falo-te nos olhos. Para dentro. Para ter a certeza que ouves, que me ouves. Olhos adentro.

Anda. Apetece-me falar de nada. Do nada habitual. Do habitual que é nada e que faz as conversas fluírem. Por nada. Por tudo. Por tanto. E é tanto... Portanto, senta-te a meu lado e abre a janela. Sim, com a janela aberta para sentires o Sol na pele e o Vento na carne. Os elementos e os sentidos juntos e apurados. Aprumados. Simbióticos para que vivam e sobrevivam na mesma dança em que redopia a nossa conversa.

Anda. Vai-me ouvindo. Sabes como fazê-lo. É como eu gosto. Como sabe bem. Como me sinto bem. Consigo fazê-lo sem te ter aqui. As mesmas conversas. Os mesmos risos. Até as mesmas perguntas. Isto porque... as respostas serão as mesmas.

Anda. Hoje, escolhi-te a ti para dançar.

12 de março de 2010

Hoje uma coisa simples...


Hoje uma coisa simples...

Eu, partículas, vagueio por aí, dispersa, desperta.
Eu, partículas, divido-me e subtraio-me para ser tudo e todo.
Para ser nada.
E no nada abranger a totalidade e tudo ser
E no nada abranger a totalidade e tudo ter.
Por tudo querer.
Nada perder.
De mim…

4 de março de 2010

O mais perto de São Pedro a que consigo chegar

Em cima do escadote. No último degrau, como o Principezinho. Não com a doçura da descoberta, nem com a inocência da procura, mas com a certeza adulta de quem não tem respostas… No último degrau, agarrada ao céu e a fazer equilíbrio por entre os pingos da chuva. Grossa. Persistente. Que insiste em não deixar de cair. Dia após dia. Para que não a esqueçamos. Grossas, as gotas na estratosfera. Frias de gelo antárctico. Galáctico. E é no último degrau que toda Eu sou elas e elas nada de mim têm ou guardam ou são… Toda Eu, aqui. Frio. Gelado. Aleatório.

Em cima do último degrau. A chuva nada de novo traz. A não ser a certeza da sua existência, a constância de uma temperatura cinzenta e agreste. Tivesse eu uma capa até aos pés como ele, o Príncipe e saberia fazer as perguntas certas, as que não têm resposta. Que são para pensar. Mas não… Comum mortal em cima de um escadote… apenas as perguntas com resposta em que se evita pensar e cujo resultado fonética é desenhado no deserto do pensamento.

Com chuva. Subo os degraus todos, até ao fim, até ao limite, até ao último sem sair do mesmo sítio. O gelo, no topo intensifica-se. Não é neve. Não tem o seu silêncio de penas nem de lã. À chuva. Como ele. Não tenho uma ovelha para falar. Trouxe outros. Os de sempre. Os habituais. Os fáceis. Que ouvem a chuva como eu e sentem o descer da temperatura mesmos sítios. Como agulhas. Sem bisturi desta vez…

No último degrau. Inspiro até ao umbigo. Geodesicamente cheia de nada e deixo que a água escorra e lave e leve. No cimo do escadote estico-me até ao limite do alcançável, como que à beira do precipício para finalmente lhe tocar e, então sim, afastar a nuvem que acinzenta este deambular incerto…

1 de março de 2010

... no pescoço, ao largo, onde se sente o estômago... (cont.)

Na cova assimétrica, onde a métrica direcciona as vontades, onde a fita condiciona os desejos, onde o olhar se perde quando não enfrenta. Na depressão que forma lagoa, mar, oceano de saliva não digerida. Saliva com sal. Saliva com suor. Saliva com conchas que vieram do mar. Saliva quente com asas. Faz voar. Pingos que escorrem com sal. Que se formam no sulco. Depressão carnal. Que se misturam e se trocam e se tocam. Enrolam e descontrolam. Geometria traiçoeira que faz arriscar. Que nos ludibria e faz querer tocar. Ao de leve… Mapa topografado a Braille desenhado. Em frente. De frente. Ao largo… na cova assimétrica para onde escorre o perfume… e o cheiro.