27 de janeiro de 2010

19 de janeiro de 2010

Palavras que jorram dos pulsos

Corta-me os pulsos. Não um risco cirúrgico qualquer a bisturi ou faca da cozinha. Vai buscar o machado, a serra eléctrica e corta-os totalmente, arranca-os à dentada, tira-os do sitio como se fosse um filme do Tarantino! Faz como ele. Deixa-me gesticular sem mais, ferozmente. Fazer o sangue jorrar de encontre as paredes brancas e estéreis. Rendilhadas de vermelho quente penetrante. Agarra-me pelos braços para que fiques manchado de sangue também enquanto tento fugir-te. Sente a queimar cada gota na tua pele, na tua cara, que é a minha e arde… Assim, velozmente, litro a seguir a litro, a cor muda. Despejo líquidos de pensamentos e palavras que passam de rosado intenso para branco pálido. Do querer para a intenção. Do sentir para a ilusão. Vê como as gotas incandescentes te acordam da letargia e te fazem renascer. Choques eléctricos de enguias fora do oceano. Mar é agora o chão que pisamos, não tarda nadamos como peixes fora de água. Sem sal. Apenas ferro intenso. Branco imenso sou eu sem ti nem sangue. Fica escrito nas paredes as palavras que jorraram dos pulsos e calaram da boca.
Quantos sentidos temos? Que sentidos usamos? Para que sentido nos perdemos? Com que sentido nos tememos? Desnorteados connosco mesmos entre o fazer e não fazer. Entre o fugir e não fugir. Entre o decidir e o nunca decidir.
Nunca a dúvida fora tão acentuada. Tão acertada… encostada ao ferro ferrugento do elevador. A ferrugem forte e ocre. Dispersa verticalmente pelo prédio acima. Ao sabor do vento e das correntes. O ferro do elevador. A ferrugem do tempo.A cor do contratempo. Passado e encontrado no mesmo sítio. O cheiro. Sempre o mesmo cheiro. Não das escadas. Esse, já estava nas entranhas e lá permanecia dormente. Latente era o cheiro da ferrugem entranhado nas lágrimas que escorriam escada abaixo. Se o barulho, em tempos, fora do crack crack, agora era do ping ping da torneira que se tinha aberto. Os despojos escorriam em sal grosso do saco cheio. Lacrimal de medo e dúvida. De ressentimento e hábito. Do hábito… normal. As partículas desmaterializadas e vaporizadas ecoavam pelo patamar. Gritavam. Gemiam. Articulavam palavras que não podiam ser ditas de verdade que possuíam. A leitura do Tarôt abdicara das cartas em prol da profecia do auto-conhecimento: os búzios estavam lançados. Desciam cada degrau manchado de sal com a certeza que só a dúvida tem…

11 de janeiro de 2010

Dança comigo, sim?

A dança era de iniciação. De puro acasalamento. Colados pelo pescoço, lá por trás. Pela nuca. Eunuca de vontade porque a dança, a verdadeira, era inata e genética. Impossível de resistir ou escapar. Ecléctica. Mas poética de palavras não ditas. De adjectivos silabados. Comedidos. Desesperados. E tão, mas tão sentidos… Era também de sedução. A dança, como uma canção. Ritmada como uma melodia que não sai do olfacto. Tatuada aos ouvidos como uma perpétua récita em Dó Menor. Dança comigo, sim? De mão na cintura, como num tango. Rosa vermelha na boca, ao canto. Porque a dança é de satisfação! De emoção: pura devoção. A outra, a mão, no pescoço, aberta como a verdade, sem piedade do que de lá sai. Da boca. Vermelha como a rosa. De contenção. Afiada como os picos. Acomodação…

O enlear dos corpos dá-se na testa com a festa na ponta dos dedos. Quilómetros de pensamentos dedilhados em uníssono. Trilhos de palavras a médio grau tremidos. Impressões digitais não detectáveis na pauta tocada a piano e saxofone. Branco e preto. Quente e frio. Perto e longe. Como uma dança. Como o tango. De mão na cintura e no pescoço. E no corpo todo…