31 de julho de 2009

O esquecimento de te ter perdido

Perdi-te...
Não percebi.
Perdi-te. Apenas isso.
Mas eu estou aqui à tua frente.
Não sei quando. Já não me lembro. Nem quando foi, nem como foi.
Eu estou aqui à tua frente. Eu! Cheguei há pouco.
A estranheza que é perder algo. A dificuldade que há em se aceitar isso mesmo. Perder-se algo que é nosso, independentemente de nos pertencer ou não. Independentemente de existir ou não. Não se trata somente de posse. Apenas falta. Não necessidade. Hábito e vício. O esquecimento de te ter perdido.
Mas o que é que te esqueceste?
Sim, não esqueci. Perdi. Os objectos mal adaptados são facilmente perdíveis, tal como um iman que não cola. A ergonomia das vontades e dos quereres como peças mal encaixadas.
Encontrei um iman debaixo da mesa...
...descolado, desmembrado, desadaptado. Perdido. Assim ficam os objectos que não se querem perder. Assim acredita quem os perde. Assim fica quem os perde. E eu perdi-te.
Mas eu estive aqui...

28 de julho de 2009

Serpenteando os contornos da vontade a par com a aniquilação da ficção que habita o irreal e imaginário pórtico que dá entrada para o hiato temporal na ponta dos dedos tatuado.

25 de julho de 2009

...anticorpos...

... a criação de anticorpos é a inevitabilidade da sobrevivência da condição humana. De que outro exército disporíamos para combater as atrocidades mundanas do dia-a-dia, de forma a que restassem apenas arranhões e contusões...

23 de julho de 2009


Em Nome do Amor Puro

"Há coisas que não são para se perceberem. Esta é uma delas. Tenho uma coisa para dizer e não sei como hei-de dizê-la. Muito do que se segue pode ser, por isso, incompreensível. A culpa não é minha. O que for incompreensível não é mesmo para se perceber. Não é por falta de clareza. Serei muito claro. Eu próprio percebo pouco do que tenho para dizer. Mas tenho de dizê-lo.
O que eu quero fazer é o elogio ao amor puro. Parece-me que já ninguém se apaixona de verdade. Já ninguém quer viver um amor impossível. Já ninguém aceita amar sem uma razão. Teixeira de Pascoaes meteu-se num navio para ir atrás de uma rapariga inglesa com quem nunca tinha falado. Estava apaixonado, foi parar a Liverpool. Quando finalmente conseguiu falar com ela, arrependeu-se. Quem é que hoje é capaz de se apaixonar assim?
Hoje em dia as pessoas apaixonam-se por uma questão prática. Porque dá jeito. Porque são colegas e estão mesmo ali ao lado. Porque se dão bem e não se chateiam muito. Porque faz sentido. Porque é mais barato. Por causa da casa. Por causa da cama. Por causa das cuecas e das calças e das contas da lavandaria.
Hoje em dia as pessoas fazem contratos pré-nupciais, discutem tudo de antemão, fazem planos e à mínima merdinha entram «em diálogo». O amor passou a ser passível de ser combinado. Os amantes tornam-se sócios. Reúnem-se, discutem problemas, tomam decisões. O amor transformou-se numa variante psico-socio-bio-ecológica de camaradagem. A paixão, que deveria ser desmedida, é na medida do possível. O amor transformou-se numa questão prática. O resultado é que as pessoas em vez de se apaixonarem de verdade, ficam praticamente apaixonadas.
Eu quero fazer o elogio do amor puro, do amor cego, do amor estúpido, do amor doente, do único amor verdadeiro que há. Estou farto de conversas, farto de compreensões, farto de conveniências de serviço. Nunca vi namorados tão embrutecidos, tão cobardes e comodistas como os de hoje. Incapazes de um gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de ousadia, são uma raça de telefoneiros e capangas de cantina, malta do «tá bem, tudo bem», tomadores de bicas, alcançadores de compromissos, bananóides, borra-botas, matadores de romance, romanticidas.
Já ninguém se apaixona? Já ninguém aceita a paixão pura, a saudade sem fim, a tristeza, o medo, o desequilíbrio, o custo, o amor, a doença que é como um cancro a comer-nos o coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo?
O amor é uma coisa, a vida é outra. O amor não é para ser uma ajudinha. Não é para ser o alívio, o repouso, o intervalo, a pancadinha nas costas, a pausa que refresca, o pronto-socorro da tortuosa estrada da vida, o nosso «dá lá um jeitinho» sentimental. Odeio esta mania contemporânea por sopas e descanso. Odeio os novos casalinhos. Por onde quer que se olhe, já não se vê romance, gritaria, maluquice, fachada, abraços, flores. O amor fechou a loja. Foi trespassado ao pessoal da pantufa e da serenidade.
Amor é amor. É essa a beleza. É esse o perigo. O nosso amor não é para nos compreender, não é para nos ajudar, não é para nos fazer felizes. Tanto pode como não pode. Tanto faz. É uma questão de azar. O nosso amor é para nos amar, para nos levar de repente ao céu, a tempo de ainda apanhar um bocadinho de inferno aberto. O amor é uma coisa, a vida é outra. A vida às vezes mata o amor. A «vidinha» é uma conveniência assassina.
O amor puro não é um meio, não é um fim, não é um princípio, não é um destino. O amor puro é uma condição. Tem tanto a ver com a vida de cada um como o clima. O amor não se percebe. Não é para se perceber. O amor é um estado de quem se sente.
O amor é a nossa alma. É a nossa alma a desatar. A desatar a correr atrás do que não sabe, não apanha, não larga, não compreende. O amor é uma verdade. E é por isso que a ilusão é necessária. A ilusão é bonita. Não faz mal. Que se invente e minta e sonhe o que se quiser. O amor é uma coisa, a vida é outra. A realidade pode matar. O amor é mais bonito que a vida. A vida que se lixe.
Num momento, num olhar, o coração apanha-se para sempre. Ama-se alguém. Por muito longe, por muito difícil, por muito desesperadamente. O coração guarda o que se nos escapa das mãos. E durante o dia e durante a vida, quando não está lá quem se ama, não é ela que nos acompanha – é o nosso amor, o amor que se lhe tem.
Não é para se perceber. É sinal de amor puro não se perceber, amar e não se ter, querer e não guardar esperança, doer sem ficar magoado, viver sozinho, triste, mas mais acompanhado de quem vive feliz. Não se pode ceder, não se pode resistir. A vida é uma coisa, o amor é outra. A vida dura a vida inteira, o amor não. Só um minuto de amor pode durar a vida inteira. E valê-la também."


Miguel Esteves Cardoso
in
Último Volume, pg 75

22 de julho de 2009

Chega-te para lá

Chega-te para lá. Deixa-me ver o Mundo neste cantinho. Deixa-me olhar com atenção para as curvas e contra-curvas desta bola gigante. Deixa-me ser o seu umbigo onde germinam as vontades e os sonhos. Deixa-me cheirar a sua rotação, sentir o seu odor, ouvir o que todos vêem e apanhar boleia na sua música. Quero agarrar uma das estrelas que nos ilumina, não a maior nem a mais próxima, apenas a mais bonita, a mais vistosa. Guardá-la junto a mim para que me ilumine sempre, para que eu possa iluminar os outros também, às vezes. Como é bom estar aqui, onde me apetece estar. Gosto que aqui estejas também, a ver o mesmo que eu, a sentir o que eu gostaria de sentir se olhasse através dos teus olhos. Oiço pelos meus, ouvidos. Sinto-o por ti, em mim, assim. Aqui.

Usurpação

Usurpar uma vida que não é a nossa. O voyeurismo de espreitar algo que não nos pertence por herança, mas sim por direito. Manter cativa uma história de algo, uma teia de acontecimentos na qual personagens, pessoas, figuras, coisas, com as suas situações, são transformadas em enredos. Vivê-la como nossa, senti-la mais do que quem a escreve, por ser nossa naquele momento. A verdadeira projecção. Mais do que espreitar para janela da vizinha, é viver a sua vida sem sofrer fisicamente as consequências, mas ultrapassar as mesmas barreiras psicológicas, ultrapassar a mistura das barreiras lidas com as realmente vividas. O sentimento de posse e pertença, sem nunca possuir ou ter. Mas sentir. Os sucessos, os fracassos, as alegrias, as tristezas: nossos! E no final, quando acaba, quando chega ao fim, ficar o vazio, como quando se perde alguém.
São as consequências de um bom livro.

16 de julho de 2009

...
"Mrs. Dalloway fez saber que ela mesma se encarregaria de comprar as flores."
...
Virginia Woolf
in
"Mrs. Dalloway" pg.5

15 de julho de 2009

Caminho mais fácil

é o caminho mais fácil
o de fugir e não enfrentar
o de quem não tem coragem
de quem não sabe
(se)quer o que contar

esconder e olhar para o lado
fingir que não se vê
não apaga a realidade
não mascara a verdade
nem muda aquilo que se é

princípios e valores
são intrínsecos, não se alteram
por mais que o Mundo grite
por mais que a cabeça o dite
são aquilo que de nós fizeram.

Aftas

Aftas...
Tenho-as vezes sem conta
vezes de mais.
Mas tenho uma táctica...
Mordo-as com os dentes!
vezes sem conta
mordo-as de mais.
Aplico-lhes força e dor
para ver se com a força
esgoto a dor que lhes está destinada.

Faço o mesmo com os pensamentos
Mas as aftas não desaparecem
Nem deixam de doer
E doem demais.

14 de julho de 2009


Vidas Encadeadas

Com quantas coisas à nossa volta nos identificamos num só dia?
Quanto de nós são os livros que lemos, os filmes que vimos, as histórias que ouvimos, as situações que presenciamos, aquilo que vivemos?
Eu, Tu, Ele, Nós, Vós, Eles. Somos todos o mealheiro de situações, a mala de viagem para um fim-de-semana, para um mês. Na nossa bagagem levamos o que queremos e o que não queremos, mas que ainda cabe, cabe sempre...
Quantas histórias cabem dentro de uma história? Quantas histórias tem a nossa história? Leio Virginia Woolf e deliro com o encadeamento das personagens que se cruzam umas com as outras num só dia. Como as suas histórias se completam umas nas outras. Como a vida de uma personagem se encadeia com a vida de outra personagem totalmente desconhecida para a primeira e, assim, como as suas histórias se completam, mais uma vez.
Vejo "Revolutionary Road" e pergunto-me com quantas histórias dentro da história me identifico? Quantas daquelas personagens poderia ser Eu? Qual daquelas personagens quereria Eu ser? Conseguiria Eu ser?
Passeio na rua e questiono-me se a pessoa que atravessa a passadeira no sentido contrário pensará o mesmo. Trocamos olhares e duas vidas ficam encadeadas por uma determinada situação. Por uma mera passadeira. E sei que influenciei o dia de alguém, porque esse alguém influenciou o meu. Sem nos tocarmos, sem nos falarmos, sem nos ouvirmos: apenas com o olhar e com a imaginação.

13 de julho de 2009

Bastasse...

Bastasse dizer "Adeus"
para que tudo ficasse para trás,
arrumado nas gavetas da memória.

Bastasse dizer "Já chega"
para que aquilo que não queremos pensar,
não assumasse ao nosso pensamento vezes de mais ao dia.

Bastasse dizer "Foi bom"
para que a saudade não assombrasse as nossas certezas
a cuspo coladas nas costas...

12 de julho de 2009

Reflections of a Skyline


"And I want to play hide-and-seek and give you my clothes and tell you I like your shoes and sit on the steps while you take a bath and massage your neck and kiss your feet and hold your hand and go for a meal and not mind when you eat my food and meet you at Rudy´s and and talk about the day and type up your letters and carry your boxes and laugh at your paranoia and give you tapes you don't listen to and watch great films and watch terrible films and complain about the radio and take pictures of you when you´re sleeping and get up to fetch you coffee and bagels and Danish and go to Florent and drink coffee at midnight and have you steal my cigarettes and never be able to find a match and tell you about the tv programme I saw the night before and take you to the eye hospital and not laugh at your jokes and want you in the morning but let you sleep for a while and kiss your back and stroke your skin and tell you how much I love your hair your eyes your lips your neck your breast your arse your
and sit on the steps smoking till your neigbour comes home and sit on the steps smoking till you come home and worry when you´re late and be amazed when you´re early and give you sunflowers and go to your party and dance till I´m black and be sorry when I´m wrong and happy when you forgive me and look at your photos and wish I´d known you forever and hear your voice in my ear and feel your skin on my skin and get scared when you´re angry and your eye has gone red and the other eye blue and your hair to the left and your face oriental and tell you you´re gorgeous and hug you when you´re anxious and hold you when you hurt and want you when I smell you and offend you when I touch you and whimper when I´m next to you and whimper when I´m not and dribble on your breast and smother you in the night and get cold when you take the blanket and hot when you don´t and melt when you smile and dissolve when you laugh and not understand why you think I´m rejecting you when I´m not rejecting you and wonder how you could think I´d ever reject you and wonder who you are but accept you anyway and tell you about the tree angel enchanted forest boy who flew across the ocean because he loved you and write poems for you and wonder why you don´t believe me and have a feeling so deep I can´t find words for it and want to buy you a kitten I´d get jealous of because it would get more attention than me and keep you in bed when you have to go and cry like a baby when you finally do and get rid oh the roaches and buy you presents you don´t want and take them away again and ask you to marry me and you say no again but keep on asking because though you think I don´t mean it I do always have from the first time I asked you and wander the city thinking it´s empty without you and want what you want and think I´m losing myself but know I´m safe with you and tell you tha worst of me and try to give you the best of me because you don´t deserve any less and answer your questions when I´d rather not and tell you the truth when I really don´t want to and try to be honest because I know you prefer it and think it´s all over but hang on in for just ten more minutes before you throw me out of your life and forget who I am and try to get closer to you because it´s beautiful learning to know you and well worth the efford and speak German to you badly and Hebrew to you worse and make love with you at three in the morning and somehow somehow somehow communicate some of the overhelming undying overpowering unconditional all-encompassing heart-enriching mind-expanding on-going never-ending love I have for you."


Sarah Kane in "Crave"
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10 de julho de 2009

Para quê? Pelo quê? Porquê?

Hoje, ao olharmos todos para o céu, falávamos que era ao ver o movimento da Lua que nos apercebíamos que o tempo andava também, da esquerda para a direita, tal como o ponteiro do relógio. Da esquerda para a direita.
Sugeri que a prendessemos com pregos, para assim ficar imóvel, imutável, bem como o tempo, parado, estagnado. Bem como a Lua.

Para quê?
Pelo quê?
Porquê?

O tique-taque faz parte de nós.
Mesmo que não o oiçamos.
Mesmo que não o queiramos ouvir.

9 de julho de 2009

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As pequenas metas, os pequenos objectivos, os pequenos solstícios, tornam-se grandes na sua soma.
É disso que nos esquecemos quando tendemos a pensar a uma escala maior.
As poucas grandes derrotas, sobrepõem-se às muitas pequenas conquistas.
Mas só no Universo da nossa Cabeça.
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Agarro a caneta
com os olhos postos na janela
olho para a rua
mas não vejo o que lá vai.
Penso no que quero
analiso o que sinto
e tento transformá-lo
em algo mais
em algo com algo mais
em algo que me faça mais.
Interessante.

7 de julho de 2009



6 de julho de 2009

Maria.
Nome comum, vulgar, habitual, usual, Português. Dedutivo. Presumido.
Maria subia as escadas. Vagarosamente. Degrau a degrau, subia as escadas. As mesmas de sempre. As de todos os dias. Não precisava de as contar, sabia-as de cor. Uma atrás da outra. Os desníveis. As falhas. As pedras soltas. De cor. Mas mesmo assim, contava-as. Uma atrás da outra.
Setenta e três no total.
Ia na vigésima quarta.
Ao colo trazia dois sacos. De papel. Como nos filmes americanos. Um à esquerda (ou no lado que assim denominam), outro à direita (ou no lado que assim chamam). Papel pardo, crepe. Grosso e duro. Mas papel, apenas. Abraçava os sacos como duas melancias, mas com uma mão por baixo, não se fossem rasgar. Nos filmes costumam ser resistentes. Mas não se fossem rasgar.
Ao ombro levava a mala. Grande. Enorme. Exagerada. Com a vida lá dentro, como de resto o está em todas as malas. Grandes. Enormes. Exageradas.
Trigésimo sétimo degrau.
O final do dia estava quente, um pouco húmido. Apesar do Verão, o céu estava carregado de núvens cinzentas e opacas. Estava húmido. A respiração ofegante a cada degrau, difícil. Ruidosa. Na mala estava um maço de cigarros. No fim. E uma caixa de fósforos vazia.
O degrau quarenta e cinco era o do desnível. Nada fácil com saltos altos. Mesmo com os de cunha se tornava difícil. Mas Maria já conhecia as escadas e, com um esforço extra, catapultou dois degraus de uma só vez. Mesmo com as compras americanas em cada braço. Mesmo com a vida ao ombro. Enorme.
"Boa Tarde, Maria"
"Boa Tarde, Manuel"
José era um nome mais comum. José e Maria fariam o par perfeito Português. Mas era Manuel o seu nome. Manuel apenas. Todos os dias se cruzavam entre o trigésimo quinto e o cinquagésimo sexto degrau. Hoje tinha sido mesmo no limite: cinquagésimo quinto!
Manuel, tão Português quanto José, saía do trabalho sempre à mesma hora. Picava o ponto, como se dizia. Pontual. Tanto para entrar, como para sair. Percorria as mesmas pedras da calçada todos os dias. Uma após a outra. Uma atrás da outra. Conhecia os seus desníveis. As falhas. As soltas. Mas não as contava. As certezas não se conferem. E as pedras, tão certas eram como o ponto que marcava a entrada e a saída. Todos os dias.
Maria, a mesma, sorria e dizia "Boa Tarde, Manuel". Manuel corava e, ao desviar o olhar, dizia "Boa Tarde, Maria". E o dia seguia. Da esquerda para a direita, como os ponteiros do relógio. As casualidades da vida, a par com a sua constância, a sua normalidade habitual e pontual, conferem-lhe o conforto da segurança. A segurança de saber que, até ao cinquagésimo sexto degrau, o sorriso do sol pôr apareceria, bem como a certeza que, no dia seguinte, continuaria a ter motivo para sorrir.
E Maria seguiu. Seguiu e sorriu. Com a américa ao colo e o Mundo ao ombro. Sorriu ao subir o último degrau, o que a levaria à sua realidade do dia-a-dia. E sorriu ao tropeçar no septuagésimo terceiro e ao ver as compras rebolarem escadas abaixo. As que tinha acabado de fazer acima. Mas era para baixo que as compras iam. Abaixo a fugir da realidade. E Maria sorriu. Sorriu para as compras que seguiam o caminho e as pisadas e as pedras daquilo que queriam. Seguiam quem descia.

3 de julho de 2009

Uma lágrima salgada escorre pela cara abaixo.
O que leva?
Dor. Sofrimento. Alegria. Contentamento. Prazer. Saudade. Satisfação. Felicidade. Cansaço. Desespero. Desilusão. Amor. Orgulho. Tristeza. Desapontamento. Inveja. Remorso. Arrependimento. Perda. Mágoa. Vergonha. Depressão.
...
Uma gota salgada de suor escorre pelo corpo fora.
O que leva?

2 de julho de 2009

Esta mania
de nos preocuparmos com as pessoas de quem gostamos.
A arrogância
de acreditar que podemos salvar o Mundo
com toda a nossa pequenez e insignificância.
A omnipresença
imaginária.
A pretensão,
vã, de estarmos onde não nos compete.
Poque nos preocupamos.

O curso das vidas corre sem a nossa mão
E é assim que tem que correr.
Vou à água. Sim, vou à água. À água? Sim, à água! A esta hora? Que tem a hora? É a melhor hora para se estar na praia. Sim, mas não a melhor para se ir ao banho, não tu. Está vento. Sim, eu sei. Vento, mas calor. Vou à água na mesma. Porquê? Porque quero. Porque posso. Vais ficar com frio quando saires. Eu sei que vou ficar com frio, mas apetece-me ir na mesma. Está com um ar tão apetitoso e a água nem sequer está muito fria. Está bandeira amarela. Também vi. E também sei ter cuidado. De que te serve ir à água se sabes que vais ficar com frio depois? Podias ter ido antes. Podia ter ido antes, tal como posso ir agora. E eu quero ir agora, à água. Com vento. Com bandeira amarela. O que queres tu provar? Eu? Sim, tu. Não quero provar nada. Vim à praia, está um dia óptimo e apetece-me ir à água. A quem queres provar que consegues? A mim. Não queres prová-lo a mais ninguém? Não me parece que esteja aqui mais ninguém. Terei, porventura "sozinha" escrito na testa? Estou na praia, sozinha. Vou ao banho, à água, sozinha. Portanto, não tenho que provar nada a ninguém que não a mim mesma. Porquê? Porque sim. Porque posso. Porque quero. Porque se não fôr, nunca hei-de saber se sou capaz.